Friday, September 14, 2012

Suburbando

Encontrando desenhos no mofo das telhas, ouvindo músicas que eu não sei de quem, escondido, no meu refúgio, sem dizer nada a ninguém. 

O sol mais claro do céu mais azul num dos poucos lugares que sobraram depois dos dias trágicos, depois das gerras e depois que jogaram as bombas, um dos poucos lugares onde não se precisa de credencial e você tem total liberdade para ser ninguém e todas as pessoas são simpáticas e educadas, o tipo de pessoa que aprendeu alguma coisa depois da merda que nós passamos. 

Foi o pouquinho que me sobrou e que é só meu, como um tesouro, eu escondo e jamais direi! Jamais em vida revelarei, eu não preciso compartilhar, curtir ou publicar. 

 Me dê um ou dois anos. 

 Hoje em dia, cerveja, só três. Três latas e dá pra fazer a cabeça e você se sente bem e não precisa de mais nada. A paz é tanta que você vê graça onde não tem. No Zorra Total até. Uma merda ficar velho. 

 Outro dia deu merda com um cara lá que tentou assaltar, mas pegaram ele, dai desceram o pau no cara, deram chute de todo jeito, foi mulher, velhinha, menino e eu tinha ido comprar pão, aqui ainda dá pra comprar pão com um real, é do caralho. Dai eu vi aquele corpo no chão e a galera metendo o pau nele.  Eu cheguei perto e tinha uma poça de sangue no chão e o cara tava apanhando e eu pensei em dizer pra pararem, mas quando eu cheguei perto respirei fundo e acertei um chute na canela do cara, que se encolheu e tentou engatinhar, mas acabou levando outra. 

Sai de lá atordoado e nervoso, me tremia até. Eu não sou violento e não acredito que bater em ladrão resolva alguma coisa. Sou daqueles com discurso político que fala que tem que melhorar a educação e essas merdas todas que ninguém faz. 

 Mas eu vi no chute uma oportunidade de “vingar” todas as violências que sofri nessa cidade idiota, todos os assaltos e aquela vez que eu levei um pau por não ter celular – por ter sido roubado.  Apanhar por ter sido roubado me pareceu demais, então chutei. Chutei cachorro morto mas chutei. 

 Essa é uma das coisas que o subúrbio fez comigo. Aqui é um dos poucos lugares onde a cidade ainda parece uma comunidade e as pessoas conversam e vivem juntas e querem saber como tu vai. O subúrbio me fez sentir a raiva deles, me fez sentir raiva com eles. 

Mas mesmo assim não dei mais que um chute e fiquei encostado no muro, terminando o cigarro enquanto a polícia não chega pra socorrer o cara. 

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