Tuesday, June 28, 2011

No país dos coelhos brancos, o ódio não há de imperar.

Promessa é dívida.

No começo era só uma opinião e nem todos tinham direito a isso.
Depois as pessoas foram abrindo seus espaços, alguns com palavras, uns com imagens outros com sons.
De repente, todos tinham seus espaços, todos falavam e todos tinham voz, e o que nós fazemos com esta voz? Nós a usamos para tentar calar as vozes dos outros.

O ódio é a maio tendência desde 2009, em todas as estações. Desde que conseguimos burlar as leis da física e estarmos em mais de um lugar ao mesmo tempo sem nunca calar a boca, nós falamos e falamos e falamos e normalmente nós falamos mal.

Eu geralmente amo reclamar, acho um passatempo bastante divertido, mas até eu acredito que nós passamos do ponto.

O ódio e a ignorância tomaram o espaço da amizade, das idéias, das invenções revolucionárias.

Perdi minha paixão quando perdi a vida pela segunda vez.
Perdi a tara, perdi os músculos, perdi a capacidade de raciocinar e de transformar comida em merda.

E então você corre de braços abertos em direção norte, e está um calor do caralho, mas ainda assim você toma café para aguentar o pique e Deus sabe que você precisa cagar antes de sair de casa.

Perdi a concentração, o ônibus, a paciência e os cabelos.

Senti que não mais voltaria, então fiz a seguinte declaração a imprensa:

“Venho através desta, comunicar que perdi o gosto pelas coisas pequenas da vida, minha única diversão é reclamar nas redes sociais e rir da cara de pessoas com auto estima muito elevada. Fica portanto estabelecido o fim da minha tão curta carreira no dia de hoje, vou estar off-line e posso nunca mais responder”.

Me escondi em uma caverna levando comigo um cajado para compor a cena. Estava tudo perfeito, eu era a minha válvula de escape; as únicas coisas a fazer era caçar coelhos e beber.

Logo começaram as teorias, o que teria acontecido com Dimitri Navarro? Como desistir de um mundo onde todas as pessoas tem seus próprios jatinhos particulares, luzes, flashes, paparazzi?

Ficou acertado pelo governo que todas as pessoas eram magras e bonitas e teriam um programa na televisão onde falariam de suas carreiras e entrevistariam a si mesmas, eu, portanto, estava infringindo uma lei federal, visto que estava escondido em uma caverna comendo coelhos, logo as pessoas viriam atrás de mim.

Não foi o que aconteceu.
Em meados de fevereiro do ano que vem, eu fui dado como morto pelas autoridades locais, houveram menções ao meu nome nos programas pessoais de televisão, um pouco antes de todas as pessoas começarem a entrevistarem a si mesmos sobre seus novos projetos.

Pensou-se em fazer uma homenagem, mas as pessoas não teriam tempo. Todas elas estavam fugindo dos paparazzi, dos stalkers, planejando seus novos projetos, organizando os seus portfólios sobre si mesmos e por alguma razão ainda hoje desconhecida, escolhendo um novo hino nacional. Foi acertado pelo governo que o antigo, mesmo depois de remixado pelo David Guetta não funcionava mais.

Continuei com os meus coelhos e um dia estabelecemos uma relação de troca. Os coelhos me sacrificavam um deles em troca de histórias, eu guardei as peles dos pobres coitados e logo fiz novas roupas pra mim, um dia eu reuni os coelhos e comecei a contar-lhes a história do ódio, a história do que me fez fugir.

Foi assim:
Um dia, uma das pessoas burlou a regra geral estabelecida pelo governo e além do programa pessoal de TV resolveu fazer um filme, muitas outras pessoas foram convidadas para o projeto, outras ficaram de fora e o ódio começou.

As pessoas eram acusadas de inveja e recalque aonde não existia nada. Os programas pessoais de TV, agora, além das entrevistas pessoais, contavam também com denúncias e encenações e as pessoas se voltaram uns contra os outros.

No fim dos tempos, quando resolvi fugir, se reclamava de tudo e de todos, eu estava me divertindo em uma festa dada pela Lindsay Lohan nos fundos da casa dela, estávamos todos escondidos, pois a polícia não poderia saber que não estávamos em casa gravando nossos programas. Lindsay estava me contando uma belíssima história sobre como ela costumava fazer redução de vinagre balsâmico para acompanhar seu famoso carpaccio de salmão, quando ela parou para cheirar uma carreira de pó que estava nas costas do Jim Carrey que estava deprimido.

Logo coelhos, as pessoas começaram a travar uma batalha dentro da festa e notas e mais notas de dinheiro foram queimadas, a cocaína se espalhou por toda a casa e então eu percebi o que estava acontecendo: Era tudo uma armação!

As pessoas se odiavam tanto que começaram, todas a querer dominar o mundo, cada um estava formando um exército com o que podia, toalhas de mesa, garfos, mangueiras de pressão e cafeteiras elétricas.

Fui embora depois que os stalkers contratados pelo governo começaram a se vender. Me neguei a fazer parte deste mundo e fugi no dia em que recebi na minha casa um convite de celebração da existência de uma única pessoa.

Juntei tudo que ainda restava em casa e deixei a cidade que estava em chamas.

Os coelhos, estavam todos chorando, um deles se ofereceu para o próximo sacrifício, mas eu me neguei. Comecei uma horta, os coelhos me ajudaram, passamos a viver em comunidade, eles me ensinaram a plantar e colher eu os ensinei a escrever, cantar e desenhar. Emprestei a eles os livros que eu trouxe e eles realmente adoraram! Alguns começaram a escrever seus próprios livros e ficavam bastante empolgados quando me pediam para escrever a orelha dos livros, logo, eu me transformei no escritor oficial de orelhas. Eles ficaram todos muitos felizes e todos eram bons em uma coisa.

Os coelhos eram bons e leais e me faziam esquecer a guerra lá fora. Não havia guerra entre eles. Desde que eu parei de comê-los eles se tornaram meus amigos e todos os dias, nós nos reuníamos para ouvir a história de um dos coelhos, que seria escolhido pela luz do sol do alvorecer.

E foi assim, e foi por isso que Dimitri não mais voltou.
E foi por isso que Dimitri não mais sentiu.

Para compensar os coelhos comidos sacrifiquei meu coração em nome da montanha. E desde então tive paz.

3 comments:

alinesweden said...

fantástico...agora,me dê licensa que meu jatinho tá me esperando!

instiga-me said...

:(

 Rodrigo Menezes said...

Isso é fucked up demais e eu adorei. A+, Bruno.

A parte dos programas de televisão onde as pessoas entrevistam a si mesmas me lembrou de toda a cena Mechanical Animals do Marilyn Manson, onde ele critica a sociedade e sua loucura por televisão e fama.
E a confusão visual me lembrou do clipe de I don't like the drugs (but the drugs like me), do Manson também. Gostei muito. :)